O tempo
Uma das coisas que mais me causa espanto na vida dos outros é a maneira como se vive o tempo. Eu sou de fases, ou de ondas, ou de fúrias, ou de outra coisa qualquer que signifique que tanto tenho uma enorme força de vontade e ponho tudo e todos à minha volta a mexer, como me enfio num buraco durante semanas e nem uma brisa sopra perto de mim.
Sempre pensei no tempo como algo que tem de se gerir. Uns gerem bem o tempo, outros mal. Tenho amigos ocupadíssimos, que numa semana viajam a três países, educam os filhos, cuidam da saúde dos pais e ainda têm tempo de ir tomar café com os amigos ao fim-de-semana. Tenho outros desocupados, que não têm obrigações, nem família para tomar conta, e mesmo assim não têm tempo para ninguém além dos próprios.
Para mim a gestão do tempo sempre foi como uma habilidade, uns têm jeito para a música, outros para as contas, outros para gerir bem o tempo. No entanto, tenho começado a ver o tempo não como uma régua que se divide em milímetros, mas como um elástico que se usa largo ou apertado. Para umas pessoas o tempo passa depressa e para outras devagar. Há gente que sente que o tempo tem tempo, que para o ano é muito longe de amanhã, que se não fizer hoje faz depois, gente que tem noventa anos e ainda faz planos de poupança a cinco anos. Outros há que num ano vivem dez vidas, que mudam de emprego três vezes, de casa quatro e de namorada cinco, e coleccionam acontecimentos como cromos numa caderneta. Há pessoas que se não me virem durante um ano esquecem-se de mim, outras há que acham que foi ontem. Se todos vamos do ponto A ao ponto B, parece que uns fazem mais caminho que outros, como se uns fossem em ondas e outros em linha recta.
Talvez o tempo não tenha tanto tempo quanto tempo o tempo tenha.